sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Leveza

A noite de quinta foi uma delícia. Traduzi uma parte de um artigo, comi uma torrada cheinha de salada preparada pelo marido (e parsa - a grafia disso é irrelevante), tomei banho e me arrumei. Como ele mesmo disse, eu estava leve. Venho me sentindo assim há alguns dias, apesar da TPM querida.
Fomos aproveitar a promoção da caipirinha dupla no nosso bar preferido. Que vibe boa a dessa noite.
Dormi pouco, pios tinha aula de manhã. Não tomei café, mas lembrei do hormônio da tireoide (alguém invente um subcutâneo de liberação lenta, please).
Na aula ganho um mimo de uma aluna amada, doce e dedicada. Está em frente aos livros do King. Um globinho de neve (glitter) que vai sempre me fazer lembrar dessa guria. Fiquei feliz. Depois notícias meio eca... a semana foi pesada. Aconteceu tanta coisa, falei de tanta coisa, liberei, absorvi. Passei o dia meio de ressaca, mas a noite dessa quinta foi a expansão da minha leveza interna.

À tarde resolvo me desconectar um pouco. Uma aluna desmarca pois está já de férias, curtindo o campo. Fez bem. Nada se compara à paz de estar em contato com a natureza e aqueles que amamos. Por isso, saí de casa mais tarde, rumando para um desses celeiros de produtos naturais. Precisamos de castanhas e passas e damascos e deliciosidades do tipo. Eu vestia meus sapatos de veludo vermelho, meio Dorothy, um vestido preto cheio de corações brancos, minha bolsa de cupcakes by Aline Galvão e um óculos estiloso. Nessas horas me pergunto quantos anos tenho e chego à conclusão de que tenho todas as idades juntas. 

Uma quadra depois, na esquina, avisto uma senhora com o braço imobilizado mas segurando uma sacolinha de farmácia com papeis, na outra mão uma bengala. Seu torso fazia um ângulo de 120 graus. Era fim de tarde e o trânsito estava intenso. 
Cheguei até ela, segurei sob o braço imobilizado e disse "Eu acompanho a senhora". 
Ela ergueu muito os olhos para encontrarem os meus. "Será que podemos ir?"
O motorista que liderava a fila de carros joga o braço pra fora e sinaliza que atravessemos. 
"Deus me coloca esses anjos no caminho. Faz 12 anos que estou toda quebrada, ninguém me cuida, fico sozinha. Esse Deus é muito bom, não é mesmo?"
"É, sim."  Cada uma de nós tem uma concepção diferente de deus. O meu tem letra minúscula sempre, mas isso não vem ao caso. Não digo nada sobre isso a ela, afinal, o bem é feito de coração e era isso que bastava.

Subo mais uma quadra com ela, no tempo dela, parando de quando em quando, ouvindo sua história, seus problemas médicos, a história sobre o trágico dia em que ela foi quebrada (pernas e um braço - que jamais ficou bom) há 12 anos, o marido falecido... a farmácia diária, exames mensais e quase 90 anos de vida. Ela gosta da vida, apesar de tudo. Reza muito, afinal é isso que tem para fazer já que mal caminha. O trajeto era de volta do médico. Não sei desde onde ela caminhava. Atravessei mais duas ruas com ela. Notei que não usa aparelho, mas tem uma audição exemplar. Eu vou estar surda na idade dela, não totalmente, mas surda.

Chegando à porta de entrada do prédio em que reside, falamos do cuidado dos filhos e parentes com os mais velhos. Eu penso que a vida é muito louca e ninguém sabe o que vai acontecer. Ela cuidou de muita gente, mesmo depois de estar com dificuldades de se movimentar. Eu digo "Depois fazem velório e vai todo mundo chorar a perda..." e ela "mas nem cuidaram da pessoa, nem deram bola. Faz ó que eu não vou a velório. Eu já disse que não quero velório. Que me botem no caixão e me enterrem direto. Velar  pra quê?" "Eu também não quero e  não gosto. É cheio de gente falsa e o pobre do defunto fica lá exposto."  Ela dá uma risada gostosa. Me indica o número do apartamento. Pergunto o nome dela: Eva.  "Desse nome você não vai esquecer. Não tem muita Eva por aí." "É claro que nunca vou me esquecer do teu nome." "E o teu?"  "Carolina." "Eu gosto do nome Carolina. Tenho uma bisneta. Quando estiver por aí pode vir aqui. Você é muito linda, sabia? Querida!!! Continue sempre assim muito querida. Ganhou o dia de trazer uma velha pela rua, hahaha"  "Ganhei mesmo, ouvi muitas histórias."  "Deus te abençoe. Você sabe que é muito linda e querida né." Vi que os olhos estavam brilhando de lágrimas felizes. "Deus te abençoe e até logo."

Tem aquele dia em que a gente encontra oportunidades. Agradeço aos motoristas que pararam para que atravessássemos em segurança. E sinto muito pelas mentes vazias que riram de mim, por estar acompanhando uma velha... uma velha de uma vida sofrida, uma velha forte, benevolente e corajosa. 
Estou aqui cheia de coisas para traduzir, de aulas para preparar, tenho que lavar roupa e dar uma geral na casa, mas eu precisava contar essa história.  Eu nunca direi à Eva, mas deus pra mim são esses encontros entre almas que se ajudam, seja no simples atravessar a rua, seja mostrando um pouco da história de vida que ensina tanto em tão pouco tempo. Geralmente chego ao trabalho em 5 minutos. Hoje levei 25, mas encontrei um pouquinho de deus, encontrei uma alma que precisava de um cafuné.... e eu não sabia, mas precisava ver a felicidade nos olhos dela, daquela alma dolorida. Obrigada, Eva, por trazer paz pra dentro de mim.

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Arrogância Sulista

Estou eu lendo sobre a palestra do Oscar, que foi vaiado por mostrar estrelismo e arrogância ao invés de realmente esinar os jovens sobre obstinação.

Eu não dou um ovo pelo Oscar. Não por ele, mas porque ele não me interessa. Enfim, o cara tá lá, ganhando um extra depois de aposentado...

Aí nos comentários: "Mais um sulista arrogante".

Pausa dramática para ódio, xingamentos mentais e o meu mais sincero foda-se pro cara que disse isso.

Como assim "sulista"? Quem entra na classe dos sulistas? Ele é de onde? De que hemisfério? Será que ele mora no sul do estado dele?
Xenofobia é sério... blá blá blá, mas ele só chamou o cara de arrogante, nada de mais.. Não, ele chamou um povo todo de arrogante!

Ei, senhor, vai tomar um suco de cicuta e depois a gente conversa.

Confesso que os Chineses me dão um pouco de medo, mas por causa de serem um tanto controladores. Mas se eu conhecer um chinês por aí, beleza.
Me irrita muito quem acha que todo Nordestino é preguiçoso, que os Acreenses não existem, que os Amazonenses são todos índios que não sabem de nada, que os Paulistas são uns workaholics fdp, que Carioca é ladrão e funkeiro... ou que os Americanos são todos maus, os Ingleses frios e assim por diante....

Eu conheço gente daqui de PF que junta todas essas características sem ser arrogante como os sulistas, mesmo sendo sulista..



E aí? Como explicar, tiozinho?

Voltando àquele texto que compartilhei ontem: é culpa da escola...e da mídia. A escola não é de toda ruim, calma. Mas tem muita coisa ensinada por 'educadores' da escola e da tv que se perpetuam de uma forma avassaladora. (não vou falar em religião, ok?)

O que se deve ensinar é que cada um de nós é um universo único, com peculiaridades exclusivas e outras características comuns, pois estamos todos em sintonia, somos todos feitos de poeira estelar.
E sendo nós universos, cada um traz características especiais, que não podem jamais ser limitadas a oriundas de onde moramos ou de onde estamos. Fosse simples assim, o mundo seria outro. Seria ainda mais fácil alienar todos, sem exceções.

Mas aquele senhor é um alienado. E por isso não achei necessário entrar num monólogo com ele. Espero de verdade que um dia ele e taaaantos aprendam que perpetuar a ignorância é evoluir de maneira suja e doentia.  

Mas o que mesmo significa evolução?


Bom dia.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Pela paz da privacidade!

Era uma vez uma época em que não existia celular. Se quisessem falar contigo, que ligassem pra tua casa ou pra casa onde você estivesse. Nas praias do Sul eram filas enormes nos mini-mercados em frente a um aparelho quase extinto, o orelhão.  Era uma paz. A gente sabia falar o que interessava a quem interessava.  O criedo cumpria o horário de voltar pra casa, porque não tinha como avisar qualquer mudança de planos. Tinha era que correr pra casa, avisar os pais e, com sorte, poder sair novamente.

Aí inventaram o telefone móvel, que dada sua popularidade, tornou a privacidade mais privada: tem quem pode. Aí a gente encasquetou que tinha que sair de casa com o celular, sempre, sem exceções. Fosse pra jogar a cobrinha enquanto esperava o ônibus, fosse pra ligar prazamiga avisando que já estava na praça de alimentação do xópim. 

E ao contrário do que se diz, o fim do mundo como o conhecíamos foi mesmo no bug do milênio, porque depois disso acabou a era do estar só.  E agora você envia uma mensagem, é avisado de quando o receptor concluiu a leitura e, por qualquer motivo, não te respondeu. Não posso mais me calar diante de algo que não quero responder? Não posso mais mentir que não li porque ainda estou pensando na resposta, ganhando mais um tempinho?  Preciso de hackers pra criar um aplicativo que pare com essa violação. Sim, porque me sinto violada, é um abuso contra minha privacidade e meu direito de escolha.

É CPF na nota, que logo será obrigatório, denunciando tudo que você consome. É o FB Messenger, Whatsapp denunciando que você leu e não respondeu. É Foursquare avisando todo mundo onde vocês está, porque alguém te marcou mesmo que você não queira... é o vizinho te filmando quando você sai pelada do banho e esqueceu a janela do quarto aberta. .. ou aquela triste que tira uma foto ruim de você na praia.

Lázaro, alguém nos ajude a entender o que é isso! O que é essa sociedade que te cobra resposta de tudo: “ eu não sou importante que você esqueceu de me responder?” “o que está acontecendo contigo que engordou e foi pra raia cheia de celulite?” “que cabelo é esse? Que tatuagem é essa? Você usa cropped com essa barriga?” “como que você vem aqui na festa e não me avisa?” “por que você não vai no show?” “ah, nem tava doente, te vi bebendo na tua sacada!” “não tem dinheiro pra isso, mas tem dinheiro praquilo!!!” “tava trabalhando? Então por que tá on no feice?”

Velho, me deixa de boa que eu vou te deixar de boa. A vida é muito mais que isso. Não me acompanha que eu não sou série, quem dirá a porcaria de uma novela. Se eu não te respondi é porque não sei o que te dizer, ou porque quero te mandar pro inferno ou porque me esqueci, porque estou falando com mais 8 pessoas , porque tô falando com gente no feice, no uatz, no issekê, no maldito do chaton!  Oremos por atualizações em que a visualização seja extinta, por um mundo mais anos 90, quando a tecnologia era massa e não te amassava contra a parede, quando não te dava uma tranquinha antes de entrar no palco.... por um mundo em que a gente possa não ser obrigada!