quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Pela paz da privacidade!

Era uma vez uma época em que não existia celular. Se quisessem falar contigo, que ligassem pra tua casa ou pra casa onde você estivesse. Nas praias do Sul eram filas enormes nos mini-mercados em frente a um aparelho quase extinto, o orelhão.  Era uma paz. A gente sabia falar o que interessava a quem interessava.  O criedo cumpria o horário de voltar pra casa, porque não tinha como avisar qualquer mudança de planos. Tinha era que correr pra casa, avisar os pais e, com sorte, poder sair novamente.

Aí inventaram o telefone móvel, que dada sua popularidade, tornou a privacidade mais privada: tem quem pode. Aí a gente encasquetou que tinha que sair de casa com o celular, sempre, sem exceções. Fosse pra jogar a cobrinha enquanto esperava o ônibus, fosse pra ligar prazamiga avisando que já estava na praça de alimentação do xópim. 

E ao contrário do que se diz, o fim do mundo como o conhecíamos foi mesmo no bug do milênio, porque depois disso acabou a era do estar só.  E agora você envia uma mensagem, é avisado de quando o receptor concluiu a leitura e, por qualquer motivo, não te respondeu. Não posso mais me calar diante de algo que não quero responder? Não posso mais mentir que não li porque ainda estou pensando na resposta, ganhando mais um tempinho?  Preciso de hackers pra criar um aplicativo que pare com essa violação. Sim, porque me sinto violada, é um abuso contra minha privacidade e meu direito de escolha.

É CPF na nota, que logo será obrigatório, denunciando tudo que você consome. É o FB Messenger, Whatsapp denunciando que você leu e não respondeu. É Foursquare avisando todo mundo onde vocês está, porque alguém te marcou mesmo que você não queira... é o vizinho te filmando quando você sai pelada do banho e esqueceu a janela do quarto aberta. .. ou aquela triste que tira uma foto ruim de você na praia.

Lázaro, alguém nos ajude a entender o que é isso! O que é essa sociedade que te cobra resposta de tudo: “ eu não sou importante que você esqueceu de me responder?” “o que está acontecendo contigo que engordou e foi pra raia cheia de celulite?” “que cabelo é esse? Que tatuagem é essa? Você usa cropped com essa barriga?” “como que você vem aqui na festa e não me avisa?” “por que você não vai no show?” “ah, nem tava doente, te vi bebendo na tua sacada!” “não tem dinheiro pra isso, mas tem dinheiro praquilo!!!” “tava trabalhando? Então por que tá on no feice?”

Velho, me deixa de boa que eu vou te deixar de boa. A vida é muito mais que isso. Não me acompanha que eu não sou série, quem dirá a porcaria de uma novela. Se eu não te respondi é porque não sei o que te dizer, ou porque quero te mandar pro inferno ou porque me esqueci, porque estou falando com mais 8 pessoas , porque tô falando com gente no feice, no uatz, no issekê, no maldito do chaton!  Oremos por atualizações em que a visualização seja extinta, por um mundo mais anos 90, quando a tecnologia era massa e não te amassava contra a parede, quando não te dava uma tranquinha antes de entrar no palco.... por um mundo em que a gente possa não ser obrigada!



Um comentário:

  1. Bem verdade!!! Onde vamos parrar desse jeito?? A satisfação que temos que dar é quase como uma obrigação.

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